"Desde 2017, o Brasil conviveu com trĂȘs grandes regras fiscais que moldaram o arcabouço fiscal brasileiro até 2022 e restringiram o volume de recursos destinados à educação. Ao impedir que os gastos orçamentĂĄrios crescessem mais do que a inflação de um ano para outro, o teto de gastos se mostrou como a regra fiscal mais rĂgida jĂĄ implementada no Brasil", disse Cléo Manhas, assessora polĂtica do Inesc, em entrevista à AgĂȘncia Brasil.
Segundo ela, mesmo que de forma não explĂcita, as regras fiscais que estipulam um limite para o gasto pĂșblico levou a corte de investimentos em educação. No perĂodo analisado pelo relatório, por exemplo, os recursos financeiros voltados à educação bĂĄsica ficaram em um patamar baixo, aumentando somente nos anos em que houve alguma flexibilização nas regras fiscais, como ocorreu em 2023."O ano de 2023 se diferencia dos demais por termos um novo governo e pelo fato de ser o Ășnico ano em que o orçamento pĂșblico não estava restrito a alguma regra fiscal de teto de gastos. Nele, constatamos uma redução expressiva do quadro de subfinanciamento, quando comparado com a média dos anos que o antecederam. Por se tratar de um ano isolado, ainda não deu tempo de os recursos financeiros promoverem mudanças nos Ăndices qualitativos de educação, mas notoriamente reduzimos a distância para o nĂvel de gastos compatĂvel com uma educação de qualidade, calculado por especialistas da ĂĄrea", afirmou Cléo;
"Ainda que o ano de 2023 tenha se mostrado um alento para o subfinanciamento da educação, o fato é que ainda estamos distantes do volume de recursos tido como adequado para financiar os custos referentes a uma educação de qualidade", acrescentou.
Para a assessora do Inesc, os maiores prejudicados com o patamar baixo de financiamento para a educação são os grupos de estudantes indĂgenas, pretos e pardos. No Amazonas e em Mato Grosso do Sul, por exemplo, dois dos estados com maior percentual de estudantes indĂgenas do Brasil, os gastos per capita com educação entre os anos de 2019 e 2021 ficaram abaixo da média nacional de R$ 5 mil por ano.
"Esse estudo mostra que o argumento de que a escassez de recursos melhora a sua alocação é frĂĄgil. Na verdade, regras rĂgidas prejudicam o financiamento de ĂĄreas importantes para o paĂs, que não tĂȘm lobby financeiros a seu favor, como é o caso da educação", conclui.
O relatório do Inesc analisou o financiamento do ensino pĂșblico entre os anos de 2019 e 2023 em cada um dos 26 estados e no Distrito Federal.
O levantamento revelou ainda que, entre os anos de 2019 e 2022, apenas cinco estados brasileiros e o Distrito Federal (DF) conseguiram ultrapassar a média nacional de gastos por aluno da rede pĂșblica por ano, estabelecida em cerca de R$ 5 mil. As unidades federativas que conseguiram obter esse resultado foram o DF, seguido pelo AmapĂĄ, Acre, São Paulo, Roraima e o ParanĂĄ.
Em 2020, pior resultado do perĂodo, apenas essas seis unidades federativas conseguiram ultrapassar a média nacional. Em 2022, ano de eleições no paĂs e com liberação de emendas parlamentares que flexibilizaram o teto de gastos, o resultado foi melhor, com 14 unidades federativas conseguindo ultrapassar a média nacional. Além do Distrito Federal, AmapĂĄ, Acre, São Paulo, Roraima e ParanĂĄ, também conseguiram ultrapassar a média os estados de GoiĂĄs, do Tocantins, de Mato Grosso, Rondônia, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, do Amazonas e de Sergipe.
O relatório demonstrou ainda que, em alguns estados como o Rio Grande do Sul, Maranhão e Alagoas, a média não só foi mais baixa que a nacional em 2023, mas também houve grande discrepância entre a expectativa e a realidade: enquanto esses estados deveriam investir entre R$ 9,8 mil e R$ 10,9 mil por aluno a cada ano, os gastos com educação por matrĂcula não chegaram, na realidade, a atingir, mais do que R$ 3,3 mil.
"A situação se agrava ainda mais se pensarmos que os recursos despendidos ainda teriam de corrigir a dĂvida educacional com as gerações passadas, bem como resgatar estudantes em idade escolar que evadiram da educação bĂĄsica", observou..
Para a assessora do Inesc, a educação precisa ser tratada como investimento, não como gasto. Por isso, ela defende a necessidade de desvincular as transferĂȘncias para a educação de uma regra fiscal de teto de gastos. "Em primeiro lugar, é preciso tratar a educação como investimento e não como gasto que pode ser cortado a favor dos ventos. Ela precisa ser tratada como polĂtica pĂșblica que pode garantir cidadania e direitos a todas as pessoas, além de contribuir para o desenvolvimento do paĂs", afirmou.
"O que propomos, como caminhada necessĂĄria para superar o subfinanciamento da educação nas unidades da federação, é a desvinculação das transferĂȘncias educacionais de qualquer regra fiscal de teto. Os pisos são bem-vindos para impedir que governos mais sensĂveis aos interesses privados reduzam os gastos até nĂveis ainda mais alarmantes, mas o limite superior se mostrou entrave significativo nos Ășltimos anos", ressaltou.
Fonte: AgĂȘncia Brasil